Maria Regina Fay de Azambuja
Procuradora de Justiça integrante do Ministério Público do Rio
Grande do Sul

“Nenhuma criança será objeto de
qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos
seus direitos fundamentais”.
Artigo 5º Estatuto da Criança e do Adolescente
Resumo: A
ordem constitucional brasileira, garantidora do princípio da dignidade humana e
do Doutrina da Proteção Integral à criança, estatuída em 1988, passa a exigir a
revisão de muitas práticas consolidadas ao longo do tempo, embasadas no não reconhecimento
de direitos à população infanto-juvenil. O Superior Interesse da Criança
rechaça a velha prática de inquirir a vítima de violência sexual intrafamiliar
em face das consequências nefastas que acarreta ao desenvolvimento físico,
social e psíquico da criança, considerada, pela lei, pessoa em fase especial de
desenvolvimento. O trabalho interdisciplinar, na atualidade, assume maior
relevância na garantia dos direitos assegurados à criança, permitindo
investigar o dano que a violência sexual intrafamiliar causa no aparelho
psíquico da criança, liberando-a da reedição do trauma sempre que é chamada a
prestar depoimento e produzir prova da autoria e materialidade da violência
sexual sofrida.
Sumário: 1. Introdução. 2. O princípio do Superior Interesse da Criança. 3. A violência sexual intrafamiliar praticada contra a criança. 4. Inquirição da criança antes da Constituição Federal de 1988. 5. A produção da prova à luz das disposições constitucionais. 6. A materialidade nos crimes que envolvem violência sexual
intrafamiliar pratica contra a criança. 7. Considerações Finais. 8. Referências bibliográficas.
Palavras-chave: Violência
Sexual. Criança. Inquirição. Interdisciplinaridade.
1. Introdução
A condição de sujeito de direitos é uma conquista recente da infância. A
criança, historicamente vista como objeto a serviço dos interesses dos adultos,
a partir do século XX, passa a ser compreendida como uma etapa do
desenvolvimento humano. Vários documentos internacionais alertam para a sua
relevância, desencadeando a revisão das legislações, condutas e procedimentos
adotados com o intuito de garantir direitos àqueles que ainda não atingiram
dezoito anos. No Brasil, a Constituição Federal de 1988, em consonância com a
Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, é considerada o
divisor de águas, seguida, em 1990, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
Entre as diversas manifestações da violência praticada contra a criança,
a sexual intrafamiliar é responsável por sequelas que podem acompanhar a sua
vida, com reflexos no campo físico, social e psíquico, justificando o
envolvimento de profissionais de várias áreas na busca de alternativas capazes
de minorar os danos.
Exigir da criança a responsabilidade pela produção da prova da violência
sexual, através do depoimento judicial, como costumeiramente se faz, não seria
uma nova violência contra a criança? Estaria a criança obrigada a depor? Estes
e outros questionamentos precisam ser enfrentados sob a ótica da Doutrina da
Proteção Integral.
O presente artigo traz à reflexão a inquirição da vítima de violência
sexual intrafamiliar, à luz do princípio do superior interesse da criança, em
face das consequências que podem advir para o seu desenvolvimento físico,
social e psíquico.
2. O princípio do Superior
Interesse da Criança
A Declaração de Genebra, em 1924, afirmou "a necessidade de
proclamar à criança uma proteção especial", abrindo caminho para
conquistas importantes que foram galgadas nas décadas seguintes. Em 1948, as
Nações Unidas proclamaram o direito a cuidados e à assistência especial à
infância, através da Declaração Universal dos Direitos Humanos, considerada a
maior prova histórica do consensus omnium gentium sobre um determinado sistema
de valores . Os Pactos Internacionais de Direitos Humanos, indiscutivelmente,
proporcionaram mudança de paradigmas experimentada no final da década de
oitenta e início dos anos noventa na área da proteção à infância.
Seguindo a trilha da Declaração dos Direitos Humanos, em 1959, tem-se a
Declaração dos Direitos da Criança , e, em 20/11/89, a Assembleia Geral das
Nações Unidas proclama a Convenção sobre os Direitos da Criança, que passa a
constituir o mais importante marco na garantia dos direitos daqueles que ainda
não atingiram os dezoito anos. Antes mesmo da aprovação da mencionada
Convenção, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, com texto original redigido
em árabe, chinês, espanhol, francês, inglês e russo, o Brasil já havia
incorporado em seu texto constitucional (art. 227) as novas diretrizes.
Embora se afirme que "a ideia do valor intrínseco da pessoa humana
deite raízes já no pensamento clássico e no ideário cristão" , estando
latente desde os primórdios da civilização , o reconhecimento e a proteção dos
direitos humanos são conquistas recentes, constituindo-se a base das
Constituições democráticas modernas . Para Norberto Bobbio, "direitos do
homem, democracia e paz são três momentos necessários do mesmo movimento
histórico: sem direitos do homem reconhecidos e protegidos, não há democracia;
sem democracia, não existem as condições mínimas para a solução pacífica dos
conflitos" .
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança afirma o
direito de a criança conhecer e conviver com seus pais, a não ser quando
incompatível com seu melhor interesse; o direito de manter contato com ambos os
genitores, caso seja separada de um ou de ambos; as obrigações do Estado, nos
casos em que as separações resultarem de ação do Poder Judiciário, assim como a
obrigação de promover proteção especial às crianças, assegurando ambiente
familiar alternativo apropriado ou colocação em instituição, considerando
sempre o ambiente cultural da criança. Ao debruçar-se sobre a Convenção,
menciona Miguel Cillero Bruñol:
A Convenção representa uma oportunidade, certamente privilegiada, para
desenvolver um novo esquema de compreensão da relação da criança com o Estado e
com as políticas sociais, e um desafio permanente para se conseguir uma
verdadeira inserção das crianças e seus interesses nas estruturas e
procedimentos dos assuntos públicos.
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, em que pese
a relevância no âmbito nacional e internacional, é ainda pouco manuseada e
assimilada pelos diversos segmentos sociais, vindo a comprometer sua aplicação
em maior escala pelos povos firmatários. Para exemplificar, o artigo 3, n. 1.
determina que todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por
instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades
administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o
interesse maior da criança .
O que vem a ser o interesse superior da criança (the best interest),
mencionado na normativa internacional?
No início do século XVIII, na Inglaterra, a criança era considerada
"uma coisa pertencente ao seu pai (thing to be owned)". A custódia
era preferencialmente concedida ao pai. Posteriormente, a preferência passou à
mãe. Neste período, as Cortes da Chancelaria inglesas "distinguiram as
atribuições do parens patriae de proteção infantil das de proteção dos
loucos" . Na tradição anglo-saxã, segundo Luiz Edson Fachin, alguns
fatores estão presentes na concretização do princípio do superior interesse da
criança:
(...) o amor e os
laços afetivos entre o pai ou titular da guarda e a criança; a habitualidade do
pai ou titular da guarda de prover a criança com comida, abrigo, vestuário e
assistência médica; (...) o lar da criança, a escola, a comunidade e os laços
religiosos; a preferência da criança, se a criança tem idade suficiente para
ter opinião; e a habilidade do pai de encorajar contato e comunicação saudável
entre a criança e o outro pai.
Em 1813, nos Estados Unidos, a Corte de Pensilvânia reconheceu o
superior interesse da criança na solução de disputas judiciais relacionadas à
guarda do filho, no período pós-dissolução da sociedade conjugal dos pais,
ensejando a construção da teoria jurídica conhecida como Tender Years Doctrine.
Entendeu-se, na época, que a criança, devido à pouca idade:
"necessitava
dos cuidados maternos, o que representou o critério da presunção de preferência
materna, posteriormente alterado para a orientação conhecida como tié breaker,
ou seja, a teoria que recomenda não haver preferência materna, mas a
determinação de que todos os elementos devem ser considerados dentro do
princípio da neutralidade quanto ao melhor interesse da criança" .
Na atualidade, a aplicação do princípio the best interest permanece como
padrão. Considera, sobretudo, "as necessidades da criança em detrimento
dos interesses dos pais, devendo realizar-se sempre uma análise do caso
concreto" . Não se trata de conceito fechado, definido e acabado. Relaciona-se
diretamente com a dignidade da pessoa humana, fundamento da República e
"alicerce da ordem jurídica democrática" . Nas palavras de Maria
Celina Bodin de Morais, "é na dignidade humana que a ordem jurídica
(democrática) se apóia e constitui-se". Não há como pensar em dignidade da
pessoa sem considerar as vulnerabilidades humanas, passando a nova ordem
constitucional a dar precedência aos direitos e às prerrogativas "de
determinados grupos considerados, de uma maneira ou de outra, frágeis e que
estão a exigir, por conseguinte, a especial proteção da lei" . No que
tange à infância, o estabelecimento de um sistema especial de proteção, por
parte do ordenamento jurídico, funda-se nas diferenças que esta parcela da
população apresenta frente a outros grupos de seres humanos, autorizando a
aparente quebra do princípio da igualdade, por serem "portadoras de uma
desigualdade inerente, intrínseca", recebendo "tratamento mais
abrangente como forma de equilibrar a desigualdade de fato e atingir a igualdade
jurídica material e não meramente formal" . Para Martha de Toledo Machado,
a "Constituição de 1988 criou um sistema especial de proteção dos direitos
fundamentais de crianças e adolescentes", "nitidamente inspirado na
chamada Doutrina da Proteção Integral" , valendo lembrar Norberto Bobbio
quando ressalta que "uma coisa é ter um direito que é, enquanto
reconhecido e protegido; outra é ter um direito que deve ser, mas que, para
ser, ou para que passe do dever-ser ao ser, precisa transformar-se, de objeto
de discussão de uma assembléia de especialistas, em objeto de decisão de um
órgão legislativo dotado de poder de coerção".
O princípio do interesse superior da criança encontra seu fundamento no
reconhecimento da peculiar condição de pessoa humana em desenvolvimento atribuída
à infância e juventude. Crianças e adolescentes são pessoas que ainda não
desenvolveram completamente sua personalidade, estão em processo de formação,
no aspecto físico "(nas suas facetas constitutiva, motora, endócrina, da
própria saúde, como situação dinâmica), psíquico, intelectual (cognitivo),
moral, social" , valendo lembrar que "os atributos da personalidade
infanto-juvenil têm conteúdo distinto dos da personalidade dos adultos",
trazem uma carga maior de vulnerabilidade, autorizando a quebra do princípio da
igualdade; enquanto os primeiros estão em fase de formação e desenvolvimento de
suas potencialidades humanas, os segundos estão na plenitude de suas forças.
Na atualidade, "a família se organiza em torno da criança, o que
torna inconcebível tolerar a violência nas relações entre pais e filhos" ,
porquanto o princípio do superior interesse da criança "representa
importante mudança de eixo nas relações paterno-materno-filiais em que o filho
deixa de ser considerado objeto para ser alçado - com absoluta justiça, ainda
que tardiamente - a sujeito de direito, ou seja, à pessoa merecedora de tutela
do ordenamento jurídico, mas com absoluta prioridade comparativamente aos
demais integrantes da família que ele participa".
Não há como deixar de ressaltar a postura de vanguarda do Brasil, ao
assumir, em 1988, o compromisso com a Doutrina da Proteção Integral, antes
mesmo da aprovação da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança,
representando "um norteador importante para a modificação das legislações
internas no que concerne à proteção da infância em nosso continente" .
Entre os direitos fundamentais assegurados à criança, encontramos, ao lado do
direito à vida, à saúde e à educação, o direito ao respeito e à dignidade.
Dentro deste contexto, a criança e o adolescente adquirem visibilidade,
passando a serem reconhecidos como sujeito de direitos, pessoa em
desenvolvimento e prioridade absoluta, revolucionando conceitos e práticas até
então incorporadas pelo mundo adulto. Condutas que, num passado recente,
ficavam na clandestinidade, sem visibilidade no campo social e político, com
restrita interferência estatal, como a violência sexual intrafamiliar, passam a
exigir maior estudo e atenção dos profissionais envolvidos com a criança.
3. A violência sexual
intrafamiliar praticada contra a criança
Embora sejam inúmeras as formas de violência e maus-tratos praticados
contra a criança, o abuso sexual, especificamente o intrafamiliar, assume maior
relevância, pois, "ainda que a violência com visibilidade seja a que
ocorre fora de casa, o lar continua sendo a maior fonte de violência" .
Pesquisa realizada, em 1997, pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul,
apontou que, em uma amostra de 1.579 crianças e adolescentes em situação de
rua, 23,4% não retornavam para casa para fugir dos maus-tratos. Flores e
cols.(1998) estimaram que "18% das mulheres de Porto Alegre, com menos de
18 anos, sofreram algum tipo de assédio sexual cometido por pessoas de sua
família" .
A violência sexual é "todo ato ou jogo sexual, relação hetero ou
homossexual entre um ou mais adultos e uma criança ou adolescente, tendo por
finalidade estimular sexualmente esta criança ou adolescente ou utilizá-la para
obter uma estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa" . É
também definida como o envolvimento de crianças e adolescentes dependentes e
imaturos quanto ao seu desenvolvimento em atividades sexuais que eles não têm
condições de compreender plenamente e para as quais são incapazes de dar consentimento,
ou que violam as regras sociais e os papéis familiares. Incluem a pedofilia, os
abusos sexuais violentos e o incesto, sendo que os estudos sobre a frequência
da violência sexual são mais raros dos que os que envolvem a violência física .
O abuso sexual pode ser dividido em intrafamiliar e extrafamiliar. Autores
apontam que "aproximadamente 80% são praticados por membros da família ou
por pessoa conhecida confiável", sendo que cinco tipos de relações
incestuosas são conhecidas: pai-filha, irmão-irmã, mãe -filho, pai-filho e
mãe-filha. É possível que o mais comum seja entre irmão-irmã; o mais relatado,
entre pai-filha (75% dos casos), e o mais patológico, entre mãe-filho, frequentemente
relacionado com psicose .
A violência sexual intrafamiliar praticada contra a criança "retém
os aspectos do abuso relativos ao apelo sexual feito à criança, bem como
destaca tal ocorrência no interior da família" . Ao mesmo grupo familiar
pertencem os dois pólos da ação, agressor e vítima, sendo que "as
crianças, vítimas inocentes e silenciosas do sistema e da prática de velhos
hábitos e costumes arraigados na cultura do nosso povo, são as maiores
prejudicadas neste contexto calamitoso" . Pode-se dizer que a violência
sexual intrafamiliar praticada contra a criança "está envolta em relações
complexas da família, pois os abusadores são parentes ou próximos das vítimas,
vinculando sua ação, ao mesmo tempo, à sedução e à ameaça" . Resulta de
relações de poder, expressas não somente no uso da força física do adulto,
"mas também pelas artimanhas da sedução, da persuasão e do uso do
imaginário, de tal forma que a criança vitimizada pareça uma preferida; ela é
convidada a dormir com o pai, quando assim é o caso, o que se lhe afigura como
protetor, socializador" . Esse abuso de poder que envolve a relação do
adulto sobre a criança, como assinala Carla Simone Beuter, "não se
restringe apenas à dominação e à apropriação do seu destino, mas também ao
desrespeito à criança, ao seu corpo, à sua identidade e ao ser humano como
sujeito de direitos" .
Na agressão incestuosa, a violência e distorção da posição de autoridade
invadem a família, apagando as diferenças sexuais, o espaçamento entre as
gerações, instalando uma confusão que deixa sem opção a vítima. Esta mesma
situação atinge a equipe que, de alguma forma, recebe, trata e decide sobre o
destino da vítima e sua família. A perplexidade compartilhada, as confusões dos
papéis, os mal-entendidos nas relações sustentam o segredo familiar, tanto na
família como nos órgãos oficias de atendimento da criança .
Os profissionais não são imunes às concepções sociais sobre o abuso
sexual nem às suas vivências pessoais. O desejo de negar, evitar, não ver ou
escapar do problema esconde o medo, a intolerância, a identificação com o
agressor e com a relação de poder. O horror leva a equipe a encorajar o
esquecimento do problema e a retomada (tocar para frente) da vida e do futuro.
A ansiedade e a confusão atacam a capacidade de pensar e desvirtuam o papel
profissional da equipe. A culpa leva à proteção inadequada da vítima,
permitindo situações especiais, extravasando o problema para fora do âmbito
profissional, o que pode atingir até mesmo a vida pessoal. A impotência, o
desamparo e a vergonha podem resultar em desvalorização da própria equipe, o que
determinará a paralisia dos cuidados. A paranoia ante a sensação de medo de
processo, medo das autoridades, dos familiares e colegas aumenta a paralisia
pela fantasia de devastação da vida profissional .
As inúmeras dificuldades para efetuar a denúncia, pelas próprias
características do evento, assim como os entraves verificados no atendimento
dos casos de violência sexual, quer pelos profissionais quer por parte da
família, justifica a estimativa da Organização Mundial da Saúde no sentido de
que "apenas um em cada 20 casos chega a ser notificado, ocultando assim
reais situações de violência" .
Além dos entraves para comunicação dos casos de violência sexual
intrafamiliar praticada contra a criança aos órgãos responsáveis (Conselho
Tutelar e Delegacia de Polícia), mesmo quando a denúncia se efetiva, outras
dificuldades se apresentam, recaindo, na maioria dos casos, na pessoa da
vítima, a responsabilidade pela produção da prova.
4. Inquirição da criança antes da
Constituição Federal de 1988
É comum a violência sexual intrafamiliar praticada contra a criança vir
desacompanhada de vestígios físicos, acarretando para o Sistema de Justiça
inúmeras dificuldades para desvendar os comunicados e ocorrências que chegam ao
Conselho Tutelar e à Delegacia de Polícia, assim como as denúncias que aportam
nas Varas Criminais e os litígios que se deflagram nas Varas da Infância e
Juventude e de Família, através de disputas de guarda e regulamentação de
visitas, bem como ações de suspensão e destituição do poder familiar. Dados
colhidos na investigação de 464 casos de abuso sexual, no período de um ano, em
Hospital Infantil (Child Abuse Program Annual Report, 1987), apontam que apenas
24% das crianças estudadas tinham achados físicos positivos .
A inexistência de vestígios físicos aliada à falta de testemunhas
presenciais, uma vez que a violência sexual intrafamiliar praticada contra a
criança geralmente se dá na clandestinidade, levaram os Tribunais a valorizar a
palavra da vítima, favorecendo a sua exposição a inúmeros depoimentos, no afã
de produzir a prova e possibilitar a condenação do réu. Neste sentido, vale
ilustrar:
PROVA. CRIME CONTRA
OS COSTUMES. PALAVRA DA VÍTIMA. CRIANÇA. VALOR. Como se tem decidido, nos
crimes contra os costumes, cometidos às escondidas, a palavra da vítima assume
especial relevo, pois, via de regra, é a única. O fato dela (vítima) ser uma
criança não impede o reconhecimento do valor de seu depoimento. Se suas
palavras se mostram consistentes, despidas de senões, servem elas como prova
bastante para a condenação do agente. É o que ocorre no caso em tela, onde o
seguro depoimento da ofendida em juízo informa sobre o ato sexual sofrido,
afirmando que o apelante foi o seu autor. Condenação mantida pela prática de
crime contra os costumes. (...)
ATENTADO VIOLENTO
AO PUDOR. PALAVRA DA VÍTIMA, DE 09 ANOS, COERENTE E MINUCIOSA NAS DUAS FASES DA
PERSECUTIO CRIMINIS, CORROBORADA PELO RESTANTE DA PROVA TESTEMUNHAL CONSTANTE
DOS AUTOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. Em crimes contra a liberdade sexual, geralmente
cometidos na clandestinidade, a palavra da vítima assume vital importância na
elucidação da autoria delitiva, ainda mais quando corroborada pelo restante do
conjunto probatório constante dos autos. Outrossim, importante salientar que
dificilmente a vítima mentiria em juízo, fantasiando ou inventando a estória
narrada, com o fito de prejudicar o apelante; pelo contrário, em que pese ser
uma criança de 09 anos, de maneira minuciosa e harmoniosa relatou, em ambas as
fases da perquirição da culpa, os abusos sexuais praticados pelo padrasto.
(...)
A posição adotada pelos Tribunais data de várias décadas que antecederam
a Constituição Federal de 1988. Neste tempo, não se questionava, nos feitos
judiciais e extrajudiciais, o melhor interesse da criança (best interest of the
child). Desconhecia-se a amplitude dos prejuízos que o depoimento da criança,
colhido com o fim de produzir a prova de um crime praticado, em regra, por um
familiar (pai, padrasto, avô, tio, irmão) ou pessoa de suas relações, pudesse
causar à vítima, bem como os danos que a violência sexual pudesse acarretar ao
seu desenvolvimento social e, de forma especial, ao seu aparelho psíquico. A
partir da década de setenta, estudos e pesquisas na área da saúde mental têm
contribuído para um maior entendimento do fenômeno, em especial, quando a
violência é praticada por aqueles que têm o dever de cuidá-la e protegê-la.
O reconhecimento dos direitos humanos, materializado em importantes
documentos internacionais, como a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos
da criança, e os avanços conquistados na área da saúde mental exigem novas
formas de proceder visando assegurar à criança o desenvolvimento em condições
de dignidade, como reza o artigo 3º da Lei nº. 8.069/90, passando a ser
responsabilidade de todos evitar qualquer forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão (art. 5º do ECA).
5. A produção da prova à luz das
disposições constitucionais
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, ratificada
pelo Brasil, reza:
Art. 19 - 1. Os
Estados Partes adotarão todas as medidas legislativas, administrativas, sociais
e educacionais apropriadas para proteger a criança contra todas as formas de
violência física ou mental, abuso ou tratamento negligente, maus-tratos ou
exploração, inclusive abuso sexual, enquanto a criança estiver sob a custódia
dos pais, do representante legal ou de qualquer outra pessoa responsável por
ela (sem grifo no original).
Sob o prisma da normativa internacional e da ordem constitucional,
inúmeras ações praticadas pelo Sistema de Justiça brasileiro passam a merecer
urgente revisão, como se vê de parte do acórdão proferido pelo Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul, reformado, em 9/8/05, pelo Colendo Superior
Tribunal de Justiça:
(...) a ação,
cometida pelo réu contra a vítima, não teve uma repercussão tão danosa que
exigisse uma punição exemplar. Ainda que se afirme certo desgaste psicológico
(as informações dos pais dão conta disso), penso que ele se deve muito mais as
atitudes dos adultos, tratando o assunto com grande alarde, que propriamente à
ação do agente. Esta se deu através de toques em partes do corpo da ofendida e
talvez o ato do cunilíngua. Tenho a impressão que o dano psicológico não foi
tão intenso, tão marcante que determinasse, repito, uma reprimenda rigorosa
(sem grifo no orginal).
Para o Superior Tribunal de Justiça,
(...) plenamente
justificado o grande alarde dos responsáveis pela menina que, como qualquer
membro médio da sociedade, encara essa forma de criminalidade como das mais
graves. Os crimes sexuais praticados contra menores têm consequências
gravíssimas para as vítimas e suas famílias, comprometendo o normal
desenvolvimento das crianças que tiveram o infortúnio de sofrer tão hedionda
agressão, somente, por serem inocentes (sem grifo no original).
Exigir da criança a responsabilidade pela produção da prova da violência
sexual através do depoimento judicial, como costumeiramente se faz, não seria
uma nova violência contra a criança? Estaria a criança obrigada a depor? Estes
e outros questionamentos precisam ser enfrentados sob a ótica da Doutrina da
Proteção Integral.
No âmbito da regulação do exercício do poder familiar, a oitiva pode se
dar de três formas: "(i) ex lege, ou seja, determinada pela lei em casos
específicos que trazem, normalmente, regras de dispensa motivada do
comparecimento da criança pelo juiz; (ii) por convocação do juiz, nas hipóteses
possíveis, ou (iii) por solicitação da criança" (sem grifo no original) .
Não se deve permitir "a indicação de criança como testemunha por uma das
partes, ou seja, por um dos seus pais ou de seus parentes, sob pena de a
criança se sentir envolvida de forma que se mostra pouco conveniente" (sem
grifo no original) .
Quando se aborda a oitiva da criança, importante lembrar que, com a
vigência da Lei nº 8.069/90 e, posteriormente, com o Código Civil de 2002, o
legislador passa a valorizar a opinião da criança, em especial, nos feitos que
envolvem colocação em família substituta, como se vê do artigo 28, § 1º, do
Estatuto da Criança e do Adolescente, exigindo, no caso de tutela, a sua
opinião, se já contar 12 anos (art. 1.740, III, do CC/02), e o seu
consentimento, no caso de adoção, quando o adotando contar 12 anos (art. 45, §
2º, ECA). A inovação atende aos princípios da Convenção das Nações Unidas sobre
os Direitos da Criança, consolidados na legislação pátria, permitindo que a
criança e o adolescente expressem sua opinião sobre fatos que digam diretamente
com sua rotina, oferecendo-lhes a oportunidade de participar ativamente do
processo judicial e das decisões que interfiram na sua vida familiar.
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, ratificada
pelo Brasil, responsável pelo estabelecimento de um "catálogo completo dos
direitos substanciais, civis e políticos, econômicos, sociais e culturais,
próprios à criança", detentora da força jurídica cogente de tratado , em
seu artigo 12, dispõe:
Os Estados partes assegurarão à criança que estiver capacitada a
formular seus próprios juízos o direito de expressar suas opiniões livremente
sobre todos os assuntos relacionados com a criança, levando-se devidamente em
consideração essas opiniões, em função da idade e da maturidade da criança.
Com tal propósito, se proporcionará à criança, em particular, a
oportunidade de ser ouvida em todo processo judicial ou administrativo que
afete a mesma, quer diretamente quer por intermédio de um representante ou
órgão apropriado, em conformidade com as regras processuais da legislação
nacional (sem grifo no original).
Expressar as próprias opiniões, como menciona o documento internacional,
tem sentido diverso de exigir da criança, em face de sua peculiar condição de
pessoa em desenvolvimento, em Juízo ou fora dele, o relato de situação
extremamente traumática e devassadora ao seu aparelho psíquico, vivenciada no
ambiente familiar, e mais, praticada, em regra, por pessoa muito próxima, como
o pai, o padrasto, o avô, o tio ou mesmo o irmão . Nesse sentido, observa-se a
palavra da vítima registrada em processo de destituição do poder familiar
motivado por violência sexual:
Na primeira vez em que foi dormir na casa dele, ‘quando a tia V. não
estava’, ele já a convidou para dormir na mesma cama que ele. Certa noite
acordou com a cabeça dele no peito dela. T. evidencia séria preocupação com
tais fatos, pára de falar mais de uma vez no meio da entrevista, abaixa a
cabeça e a esconde entre seus braços. Muda de assunto, falando que já fez ‘um
desenho de uma árvore, com uma corda e ela pendurada’, lembrando de momentos em
que já quis abreviar sua vida (sem grifo no original) .
Quando a Lei nº 8.069/90 reconhece a peculiar condição de pessoa em
desenvolvimento da criança e do adolescente está a falar de sua imaturidade ou,
em outras palavras, de seu estágio incompleto de desenvolvimento. Entende-se
por maturidade "a fase da vida em que a pessoa atinge um completo
desenvolvimento ou maturação físico-mental" . As etapas do desenvolvimento
humano se desdobram em várias fases: a) pré-natal; b) primeira infância; c)
segunda infância; d) terceira infância; e) adolescência; f) o jovem adulto; g)
meia-idade e h) terceira idade , abrangendo mudanças que ocorrem ao longo da
vida, envolvendo aspectos físicos, cognitivos e psicossociais. Integram o
desenvolvimento físico, as mudanças no corpo, no cérebro, na capacidade
sensorial e nas habilidades motoras capazes de influenciar outros aspectos do
desenvolvimento. As mudanças ocorridas na capacidade mental, como aprendizagem,
memória, raciocínio, pensamento e linguagem, situam-se no desenvolvimento
cognitivo, ao passo que as mudanças nos relacionamentos com os outros se
referem ao desenvolvimento psicossocial .
Não há que confundir a hipótese inovadora do artigo 28, § 1º, do
Estatuto da Criança e do Adolescente, com a inquirição cogente da criança nos
processos criminais em que se apura a existência de violência sexual. Nestes
casos, a inquirição da criança visa essencialmente produção da prova da autoria
e materialidade em face dos escassos elementos que costumam instruir o processo
com o fim de obter a condenação ou absolvição do abusador, recaindo na criança
uma responsabilidade para a qual não se encontra preparada, em face de sua
peculiar condição de pessoa em desenvolvimento ou, ainda, nos termos da
Convenção, em razão de sua imaturidade física, cognitiva e psicossocial. No
primeiro caso, - feitos que discutem a colocação em família substituta -, a
oitiva da criança tem por objetivo conhecer seus sentimentos e desejos,
permitindo ao Julgador considerá-los por ocasião da decisão; no segundo,
diferentemente, o objetivo da inquirição é a produção da prova, hipótese que
não encontra respaldo na aludida Convenção Internacional e tampouco no
ordenamento jurídico pátrio.
É do texto internacional que emerge a expressa previsão de a opinião da
criança ser colhida, de forma direta ou através de representante ou órgão
apropriado, sinalizando a clara intenção de evitar exposições inapropriadas da
criança, com riscos de danos à sua saúde psíquica. Por ser uma pessoa em
desenvolvimento, a criança carece biologicamente de "maturação nos níveis
emocional, social e cognitivo", levando-a a comportar-se, relacionar-se e
a pensar de forma diferente dos adultos . As condições de maturidade da criança
e do adulto se refletem na forma como a primeira enfrenta e reage a uma
situação de abuso sexual e pela maneira como se manifesta quando é chamada a
falar sobre o fato ocorrido .
Estudiosos da saúde mental afirmam que "a criança mais velha pode
ter a capacidade verbal de relatar o abuso, mas pode estar relutante devido ao
medo de represálias, culpa associada com o ato ou aceitação da sedução, ou medo
de dissolução da família" . Nesse sentido, aponta a decisão do Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul, lançada nos autos da Apelação Crime nº
70019975275:
A negativa da
vítima, em juízo, é perfeitamente compreensível em face do medo de uma
represália da mãe, já que, após a prisão do acusado, a família começou a sofrer
dificuldades financeiras e a mãe C. passou a quebrar objetos da sua própria
casa, agredir verbalmente os vizinhos e culpar suas filhas E., I. e M. pela
prisão do companheiro .
Nos casos de violência sexual intrafamiliar, recomendam os estudiosos
envolver a mãe no processo de revelação, sem desconhecer que, até as mães
apoiadoras, muitas vezes, "ficam tão perturbadas durante a entrevista, que
transmitem à criança a mensagem direta ou indireta de não revelar; ou as crianças
ficam tão ansiosas que se fecham para protegerem as mães" .
A violência sexual traz no seu âmago a negação ou síndrome do segredo
que envolve todo o desenrolar do processo de abuso sexual intrafamiliar, tanto
nas etapas em que o fato ainda não foi identificado, e que pode durar vários
anos , acompanhado de freqüentes ameaças ; como nas etapas que se desenvolvem
junto aos Sistemas de Saúde ou Justiça, cabendo referir que "sobreviver ao
abuso sexual da criança como pessoa intacta pode ser tão difícil para o profissional
como é para a criança e para os membros da família" .
A falta de compreensão da dinâmica do abuso sexual intrafamiliar,
verificado, com frequência, tanto nas agências de saúde como no Sistema de
Justiça, acaba por gerar intervenções inadequadas com sensíveis prejuízos ao
desenvolvimento da criança. A nomeação do abuso sexual da criança "cria o
abuso como um fato para a família", podendo "refletir-se na rede
profissional e no nosso próprio pânico e crise profissionais, quando intervimos
cegamente em um processo que muitas vezes não compreendemos" . Maria
Helena Mariante Ferreira chama a atenção para os cuidados a serem dispensados
aos profissionais que trabalham com o abuso sexual:
É necessário
salientar a necessidade de apoio e cuidado constante do profissional e equipe
que atende a criança abusada em função do aumento importante de stress que este
tipo de trabalho traz. É bem superior ao encontrado no trabalho com os demais
pacientes. É semelhantes stress que contamina as equipes que trabalham com
pacientes em centros de tratamento intensivo, ultrapassando os limites do
ambiente profissional e contaminando a vida familiar e pessoal dos cuidadores .
Inquirir a vítima, com o intuito de produzir prova e elevar os índices
de condenação, não assegura a credibilidade pretendida, além de expô-la a nova
forma de violência, ao permitir reviver situação traumática, reforçando o dano
psíquico. Enquanto a primeira violência foi de origem sexual, a segunda passa a
ser psíquica, na medida que se espera que a materialidade, que deveria ser
produzida por peritos capacitados, venha ao bojo dos autos através do seu
depoimento, sem qualquer respeito às suas condições de imaturidade. Considerar
a "fala da criança", como prevê a Convenção, necessariamente não
exige o uso da palavra falada, porquanto o sentido da norma é muito mais amplo,
estando a significar a necessidade de respeito incondicional à criança, como
pessoa em fase peculiar de desenvolvimento.
No campo psíquico, a violência sexual impingida à criança é considerada
um trauma, sendo que a extensão dos danos está ligada a maior ou menor
vulnerabilidade da vítima. Vários transtornos psiquiátricos em adultos têm sido
relacionados a algum trauma vivenciado na infância, sendo que o abuso sexual
está mais relacionado a transtornos dissociativos, o estresse pós-traumático a
acidentes . Estudos recentes apontam para a ‘influência do trauma na
configuração do aparato neuroendócrino, da arquitetura cerebral, da
estruturação permanente da personalidade e dos padrões de relacionamento
posteriores’, sabendo-se que ‘as experiências ficam marcadas na herança
genética e nos padrões de vínculo, sendo, portanto, repassadas de uma forma ou
outra para a descendência’ . Grande número de casos de violência sexual sofrido
na infância "permanece em segredo entre vítima intimidada e agressor
ameaçador, só sendo detectados quando aquela, já adulta, procura ajuda
profissional e relata o fato como significativo no seu passado" .
Trauma, de origem grega, significa ferida, furar, "sendo utilizado
na medicina para identificar as consequências de uma violência externa".
Freud "transpôs o conceito de trauma para o plano psíquico, conferindo-lhe
o significado de um choque violento capaz de romper a barreira protetora do
ego, podendo acarretar perturbações duradouras sobre a organização psíquica do
indivíduo" . Em outras palavras, trauma ou dano psíquico existe quando há
"deterioração, disfunção, distúrbio ou transtorno, ou desenvolvimento
psico-gênico ou psico-orgânico que, afetando as esferas afetivas e/ou
intelectual e/ou volitiva, limita a capacidade de gozo individual, familiar,
atividade laborativa, social e/ou recreativa" . Autores apontam que a
inquirição da criança vítima de violência sexual intrafamiliar, devido ao
"medo de represálias, culpa associada com o ato de aceitação da sedução ou
medo de dissolução da família", pode fazer com que a criança retire a
acusação , como confirma a prática forense. E, ainda, "a criança pode não
desejar discutir o(s) incidente(s) novamente porque a recordação é dolorosa e
os pais podem pertinentemente apoiar a criança nesta resistência" .
É comum a criança avistar o abusador no ambiente forense por ocasião de
sua inquirição, ainda que o depoimento não seja prestado na sua presença, fato
que contribui para reacender o conflito e a ambivalência de seus sentimentos,
porquanto, em muitos casos, "nutre forte apego pelo abusador, com quem, no
mais das vezes, mantém vínculos parentais significativos". O abusador
costuma "transferir para a criança a responsabilidade pelo ocorrido ou
pelas consequências da revelação, convencendo a vítima de que será sua culpa se
o pai for para a cadeia ou se a mãe ficar magoada com ela" . Delegacias de
Polícia, Fóruns e Tribunais não são locais apropriados para crianças; são,
essencialmente, espaços de resolução de litígios envolvendo adultos.
Não há como confundir o respeito à criança, preconizado pela Convenção
das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, ao prever a possibilidade de
ser ouvida (de forma direta ou indireta), como ressalta o artigo 12, com a
violência decorrente da exigência de produzir judicialmente a prova da
violência sexual sofrida, desconsiderando o estágio de maturidade e
desenvolvimento em que se encontra a vítima. No que tange à modalidade de
inquirição, em que pese algumas iniciativas que visam minorar as dificuldades
impostas à criança , em essência, continua a buscar a produção da prova, sem
considerar os danos que o depoimento pode causar ao aparelho psíquico da
vítima.
6. A materialidade nos crimes que
envolvem violência sexual intrafamiliar pratica contra a criança
A prova da materialidade é a questão de fundo a justificar a inquirição
da criança, independentemente de sua idade, nos feitos que envolvem a violência
sexual, em especial, o estupro e atentado violento ao pudor (artigos 213 e 214
do CP). Inquirir a criança, nos feitos criminais, não tem por finalidade saber
como ela está se sentindo ou mesmo propiciar a aplicação de medida de proteção
(art. 101 ECA), em que pese "a assistência ao paciente vítima de abuso
sexual" tenha sido objeto "de importantes estudos quanto aos seus
aspectos clínicos e de saúde mental" . A inquirição da criança, como já se
afirmou, busca trazer aos autos a prova da materialidade, em especial, nos
casos em que a violência não deixou vestígios físicos.
Entende-se por materialidade "o conjunto de elementos objetivos que
materializam ou caracterizam um crime ou uma contravenção, um ilícito
penal" . Em outras palavras, "é o oposto da inexistência do
fato" , sendo que o processo penal "coloca ênfase em provar quem
perpetrou o evento (MacMurray, 1988), uma eventualidade que pode ser
impossível, dependendo do tipo de abuso e do desenvolvimento e motivação da
criança" .
O aumento das notificações de violência sexual, aliado à necessidade de
assegurar a proteção integral à criança, tem despertado o interesse dos
profissionais em encontrar alternativas menos danosas à criança. Anualmente,
"são comunicados 5.000 casos de incesto"; "o abusador é
conhecido da criança e usa sedução ou suborno para que ela ceda", sendo
que "esta forma de tirar vantagem da imaturidade e vulnerabilidade
infantil tem uma importante consequência para a criança que, mais tarde, poderá
sentir-se culpada e responsável" .
Poderá o Juiz, segundo o sistema legal vigente, dispensar a inquirição
da criança, em especial, nos feitos criminais em que figura como vítima de
violência sexual intrafamiliar?
O sistema processual civil afirma que podem depor como testemunhas todas
as pessoas, exceto as incapazes, impedidas ou suspeitas, entendendo como
incapaz, entre outros, os menores de 16 anos (art. 405, parágrafo 1º, inciso
III, CPC) . Libera, ainda, a testemunha da obrigatoriedade de depor sobre fatos
que lhe acarretem grave dano, como se lê do artigo 406, inciso I, do mesmo diploma
legal. Muito embora a vítima não seja testemunha, mas sujeito passivo do
delito, urge que se busque, na Justiça da Infância e Juventude, Criminal ou de
Família, a exegese que melhor atenda o interesse superior da criança.
No âmbito do processo penal, "quando a infração deixar vestígios,
será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo
supri-lo a confissão do acusado" (art. 158 CPP). "Os peritos
elaborarão o laudo pericial, onde descreverão minuciosamente o que examinarem, e
responderão aos quesitos formulados" (art. 160 CPP). Por quesitos,
entende-se "as questões formuladas sobre um assunto específico, que
exigem, como respostas, opiniões ou pareceres. Os quesitos podem ser oferecidos
pela autoridade judicial e partes até o ato de diligência (art. 176 CPP)".
A comprovação da materialidade dos crimes que envolvem violência sexual
(especialmente estupro e atentado violento ao pudor), sob o prisma
médico-legal, consiste na realização de prova pericial na vítima, onde o perito
irá buscar evidências da prática de conjunção carnal ou de algum ato libidinoso
diverso da conjunção carnal, tais como lesões próximas da genitália da vítima,
presença de esperma, ruptura do hímen e eventuais lesões corporais que possam
sugerir a prática delituosa (Prado, 1972; Almeida Jr. E Costa Jr., 1985; Croece
e Croece Jr., 1995; Maranhão, 1995; Galvão, 1996; França, 1999) .
Quanto à inquirição da vítima, reza o artigo 201: "sempre que
possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da
infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar,
tomando-se por termo suas declarações. Se, intimado para este fim, deixar de
comparecer sem motivo justo, o ofendido poderá ser conduzido à presença da
autoridade" (sem grifo no original).
As opiniões divergem a cerca do valor do depoimento do ofendido no
processo: "autores há que negam categoria de prova às suas declarações,
como faz Bento de Faria: ‘(...) não é, propriamente, meio de prova, mas um
auxílio à justiça (...)’; outros consideram-no testemunha. Assim Manzini: ‘o
ofendido pelo crime, seja ou não denunciante, querelante ou parte civil, tem
plena capacidade testemunhal, e vem a ser efetivamente testemunha (o grifo é do
mestre italiano), para todas as consequências de direito, se é citado nesta
qualidade (arts. 300, 348, 353, 448 - primeira parte). O ofendido pelo delito
não está sequer isento de juramento, diferentemente do que dispunham os códigos
anteriores. Seu testemunho vale como qualquer outro e, portanto, pode ser a
única fonte de convicção do juiz’". Para o autor, "deixa bem claro
nosso Código que o ofendido não é testemunha, mas certo também é que suas
declarações constituem meio de prova" .
A jurisprudência oscila. Colhe-se do Supremo Tribunal Federal, quanto às
perguntas ao ofendido, a seguinte manifestação: "é ato informal e
praticado pelo juiz ad clarificandum. Nele não incide o princípio do
contraditório, e, por isso, as partes não intervêm no seu procedimento" .
Ao julgar o Habeas Corpus nº 67.052-1, manifestou-se a Primeira Turma: "a
audiência do ofendido (art. 201 do CPP) não se insere no âmbito da garantia do
contraditório. Precedentes do Supremo Tribunal Federal: RREE 73.705 e
85.594" . Em sentido contrário, acórdão proferido no julgamento da
Apelação Crime nº 70008977142, Sétima Câmara Criminal do TJRGS, em que foi
Relator Des. Marcelo Bandeira Pereira (23/09/2004, origem: Pelotas).
Para a doutrina tradicional, em face do princípio da verdade real,
instala-se a obrigatoriedade da inquirição da vítima, porquanto "deve o
juiz buscar todos os meios lícitos e plausíveis para atingir o estado de
certeza que lhe permitirá formar o seu veredito" . Paradoxalmente, é na
mesma doutrina que são encontrados subsídios para afastar a oitiva da vítima,
quando criança:
(...) as
declarações do ofendido constituem meio de prova, tanto quanto o interrogatório
do réu, quando este resolve falar ao juiz; (...) não se pode dar o mesmo valor
à palavra da vítima que se costuma conferir ao depoimento de uma testemunha,
esta, presumidamente, imparcial; (...) a vítima é pessoa diretamente envolvida
pela prática do crime, pois algum bem ou interesse seu foi violado, razão pela
qual pode estar coberta por emoções perturbadoras do seu processo psíquico,
levando-a à ira, ao medo, à mentira, ao erro, às ilusões de percepção, ao
desejo de vingança, à esperança de obter vantagens econômicas e à vontade
expressa de se desculpar - neste último caso, quando termina contribuindo para
a prática do crime (Psicologia Jurídica, V. II, p. 155-157). Por outro lado, há
aspectos ligados ao sofrimento pelo qual passou a vítima, quando da prática do
delito, podendo, então, haver distorções naturais em suas declarações; (...) a
ânsia de permanecer com os seres amados, mormente porque dá como certo e
acabado o crime ocorrido, faz com que se voltem ao futuro, querendo, de todo o
modo, absolver o culpado. É a situação muitas vezes enfrentada por mulheres
agredidas por seus maridos, por filhos violentados por seus pais e, mesmo por
genitores idosos atacados ou enganados por seus descendentes (sem grifo no
original) .
Na mesma linha:
(...) a criança
fantasia por natureza, podendo ser instigada por adultos a fazê-lo, ainda com
maior precisão e riqueza de detalhes, sem ter maturidade suficiente para
compreender o significado e as consequências de suas atitudes; (...) a criança
violada pelo pai pode, por razões familiares - de amor ao genitor ou por conta
da interferência da mãe, que não quer perder o marido, mesmo que o preço a
pagar seja alto - esconder a realidade, criando situações inverídicas para
proteger o culpado (sem grifo no original) .
O depoimento da vítima, considerada por alguns autores como testemunha,
não se reveste de credibilidade absoluta, porquanto suas declarações vêm
impregnadas de impressões pessoais, havendo "um certo coeficiente pessoal
na percepção e na evocação da memória, que torna, necessariamente incompleta a
recordação, de forma que não há maior erro que considerar a testemunha como uma
chapa fotográfica". Diversos são os fatores a interferir na prova
testemunhal, como o interesse, a emoção e, assim, sucessivamente .
Enrico Altavilla assinala que "não podemos manter-nos concentrados
por muito tempo, atentamente em relação a um objeto; quanto mais intensa é uma
dada concentração afetiva, tanto mais facilmente se determina, passado um certo
tempo, um desvio da atenção do primeiro objeto para um objeto diverso";
"(...) a violenta ressonância emotiva, colorida de desagrado, que em nós
pode provocar um objeto, pode, particularmente, facilitar ou apressar um desvio
de atenção" . Torna-se necessário "conhecer com precisão a posição
processual de uma testemunha e as suas relações de interesse, de amizade ou de
parentesco com as partes" , a fim de valorar com adequação o teor de seu
depoimento. O depoimento da vítima, nos crimes que envolvem violência sexual
intrafamiliar, agrega elementos que decorrem da posição ocupada na família e no
processo, porquanto, na maioria dos casos, a vítima é também a única
testemunha.
Não se pode esquecer que a criança, "mesmo dizendo a verdade, é tão
facilmente sugestionável que pode, com facilidade, ser induzida a retratar-se
numa acareação, especialmente sendo-lhe oposta uma pessoa a quem tema e
respeite" . Há que se buscar, em juízo ou fora dele,
(...) evitar a
ocorrência do segundo processo de vitimização, que se dá nas Delegacias,
Conselhos Tutelares e na presença do juiz, quando da apuração de evento
delituoso, causando na vítima os chamados danos secundários advindos de uma
equivocada abordagem realizada quando da comprovação do fato criminoso e que,
segundo a melhor psicologia, poderiam ser tão ou mais graves que o próprio
abuso sexual sofrido .
Para Eduardo de Oliveira Leite, "o magistrado dispõe de um largo
poder de apreciação", podendo, "não só rejeitar o pedido porque ele
está convicto que já tem elementos suficientes de informação, ou porque entende
preferível que a criança seja ouvida por assistentes sociais ou mesmo mediante
perícia levada a efeito por médicos e psicólogos" .
A perícia, definida como o "conjunto de procedimentos técnicos que
tenha como finalidade o esclarecimento de um fato de interesse da
Justiça", deve ser realizada por Perito, "técnico incumbido pela
autoridade de esclarecer fato da causa, auxiliando na formulação de
convencimento do juiz" . A psiquiatria forense da criança e do adolescente
"reveste-se de uma complexidade própria decorrente tanto das
características da infância e da adolescência e de seu posicionamento social
como do ordenamento jurídico especial"; o perito da infância "precisa
ser capaz de reunir e articular conhecimentos teóricos e práticos sobre
desenvolvimento infantil, psiquiatria clínica e saúde mental da criança e do
adolescente, da família, avaliação psicológica e psiquiátrica, ética forense,
legislação, entre outros" .
A perícia, levada a efeito por psicólogos e/ou psiquiatras,
especialistas na infância e adolescência, no lugar da inquirição judicial da
criança, nos crimes envolvendo violência sexual, com ou sem vestígios físicos,
mostra-se alternativa que melhor atende ao superior interesse da criança,
permitindo ao Julgador aferir a materialidade através da constatação das lesões
ou danos ao aparelho psíquico da vítima , podendo a autoridade judiciária e as
partes oferecerem quesitos a serem respondidos pelo Perito . Quando a violência
deixa vestígios físicos, não é a autoridade judicial que faz a constatação
direta das lesões, na sala de audiências, cabendo ao médico perito examinar o
corpo da vítima, em ambiente preservado, descrevendo os achados que serão
disponibilizados não só ao Julgador como também às partes, assegurado o
contraditório e a ampla defesa preconizados na Constituição Federal.
Sustentamos que a autoridade judicial, diante de pedido formulado pelos
representantes legais da vítima, pela própria vítima (art.15 do ECA) ou pelo
Ministério Público, devidamente fundamentado, de dispensa de prestar
depoimento, (ainda que seja sob a forma do Depoimento sem Dano), poderá a
autoridade judicial deferir o pedido, levando em consideração as condições
pessoais da vítima, como idade, aspectos emocionais, existência de vínculo
familiar ou afetivo com o réu. Sabe-se que, "quanto maior o grau de
dependência da criança (o que, certamente, não se esgota na reducionista
consideração da mera idade), maior o risco de se ter uma manifestação viciada
pelo temor ou pelo risco de perda que acompanha a manifestação infantil" .
Ademais, "a criança pode sempre se recusar a falar diante do juiz",
"o direito à oitiva tem como corolário o direito de recusar de
exprimir-se, isto é, o direito ao silêncio", garantido expressamente na
Carta Maior, inclusive, ao réu (artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição
Federal) .
Substituir a inquirição da criança vítima de violência sexual
intrafamiliar pela perícia psicológica e/ou psiquiátrica, através de
profissionais especializados na área da infância, aliada a outros elementos de
prova, como o estudo social e a avaliação do próprio abusador (via de regra
poupado até mesmo de uma criteriosa avaliação), é o caminho capaz de assegurar
à criança a proteção integral, reservando-se a medida apenas aos casos em que a
criança manifesta o desejo de ser ouvida pela autoridade judicial.
É momento de pensar em mecanismos de averiguar o dano psíquico , situado
no campo da proteção à saúde, em substituição à exigência da oitiva da vítima,
quando criança, como meio de provar a materialidade, evitando a reedição do
trauma já experimentado. Raramente é possível apurar os danos físicos, sem
afastar, contudo, a ocorrência do crime. As marcas mais importantes, como
sinalizam os conhecimentos científicos disponíveis na contemporaneidade, se
situam na esfera psíquica das pequenas vítimas cujas sequelas podem se estender
por toda a vida ao passo que as lesões físicas tendem a cicatrizar e
desaparecer.
7. Considerações Finais
A violência, através de várias manifestações, acompanha a história da
humanidade. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a proteção aos
direitos humanos passa a integrar a base da organização do estado democrático
de direito, passando, a criança, de objeto a sujeito de direito.
Família, sociedade e poder público passam a ser responsáveis pela
garantia de inúmeros direitos fundamentais à criança, cabendo destacar o
direito à vida, à saúde, ao respeito, à dignidade e à convivência familiar.
Conciliar o direito à convivência familiar com o direito ao respeito e à
dignidade de que é detentora a criança, quando a violência sexual intrafamiliar
aflora, constitui tarefa desafiadora aos integrantes dos Sistemas de Proteção e
Justiça. Práticas até então aceitas e repetidas passam a exigir reflexão e
revisão.
O desconhecimento, por parte de muitos profissionais integrantes dos
Sistemas de Proteção e Justiça, do funcionamento das famílias em que está
presente o abuso sexual da criança, da extensão dos danos psíquicos causados,
bem como a não utilização dos instrumentos jurídicos por um ângulo clínico
(especialmente o conteúdo das perícias psiquiátricas dos pais e das vítimas;
relevância do tratamento das vítimas; falta de exploração do trabalho
terapêutico voltado para os pais que se encontram no sistema carcerário) faz
com que a intervenção destes profissionais não contribua, como era de se
esperar, para minimizar o sofrimento da criança vítima da violência sexual
intrafamiliar.
É tempo de valorizar, além das marcas físicas, os danos produzidos no
aparelho psíquico, investindo na criação de cargos de peritos psicólogos e
psiquiatras, especialistas em crianças e adolescentes e, quiçá, criando
quesitos (a exemplo do que ocorre com as lesões corporais, o estupro, o
atentado violento ao pudor), liberando a criança da reedição do trauma sempre
que é chamada a prestar depoimento e a produzir prova de um fato em que figura
como vítima e não ré.
Outros elementos de prova que não costumam ser valorizados pelo Sistema
de Justiça, como o estudo social e a avaliação criteriosa do abusador, devem se
aliar, alargando o entendimento dos fatos e contribuindo para a busca da
verdade real, respeitando o superior interesse da criança.
O Sistema de Justiça começa a perceber a relevância do seu papel,
repensando procedimentos e investindo em ações abraçadas pelo manto da
interdisciplinaridade. Revisar condutas está na pauta das discussões
internacionais, não podendo o Brasil aguardar o alerta vindo de outros cantos
do mundo para sentir-se autorizado a dar efetividade aos paradigmas impostos
pela Carta Maior.
A mudança é lenta e há de começar por aqueles que acreditam na
possibilidade de avançar, mantendo acessa a chama da esperança e preservando
espaço para o sonho de uma vida mais digna à criança.
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