- Integra da SENTENÇA TIPO
"A"
MANDADO DE SEGURANÇA -
PROCESSO Nº 0011704-14.2010.4.05.8300
IMPTE. : ESTADO DE
PERNAMBUCO
IMPTDO.: PRESIDENTE DO
CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL E OUTROS.
Sentença registrada
eletronicamente.
I – RELATÓRIO
Trata-se de mandado de
segurança impetrado pelo ESTADO DE PERNAMBUCO contra ato praticado pelos
Presidentes dos Conselhos Federais e Regionais de Psicologia e Serviço Social,
objetivando seja declarada a ilegalidade e a inconstitucionalidade das
Resoluções nº 554/2009, do Conselho Federal de Assistência Social, e nº
10/2010, do Conselho Federal de Psicologia, e, assim, sejam afastados seus
termos.
Relata, em síntese, que
o Tribunal de Justiça de Pernambuco, através da Portaria n.º 47/2010 e do
Provimento n.º 07/2010, vem implantando o projeto intitulado "Depoimento
Acolhedor", uma forma especial de depoimento de crianças e adolescentes
vítimas de violência. Este projeto conta com o auxílio de uma equipe
multidisciplinar de profissionais, em especial, nos campos da psicologia e
serviço social.
Todavia, conforme
salienta a impetrante, a implementação do programa vem sendo obstaculizada pela
conduta da parte impetrada. Sustenta que a edição das Resoluções n.º 554/2009
(Conselho Federal de Serviço Social) e n.º 10/2010 (Conselho Federal de
Psicologia), as quais vedam os profissionais submetidos às suas regulamentações
de atuarem neste tipo de procedimento, ameaçando-os, inclusive, de abertura de
processo administrativo para apuração de responsabilidade disciplinar e ética;
fez que com os profissionais, que estariam aptos a atuar no programa, ficassem
receosos de penalidades administrativas, o que estaria impedindo a continuidade
do projeto. Por fim, requer a concessão da segurança para, no mérito, decretar
a ilegalidade das Resoluções referidas, afastando sua aplicação.
Notificados a prestarem
as informações, as autoridades coatoras fizeram as considerações a seguir.
A Presidente do
Conselho Regional de Psicologia, fls. 85/86, limita-se a afirmar que está
cumprindo apenas a Resolução do Conselho.
O Conselho Regional de
Serviço Social, fls. 92/98, alega que o papel do assistente social é diverso do
previsto no projeto e que a "autonomia profissional é comprometida na
hipótese de determinação judicial, onde o/a assistente social tem que abrir mão
dessa prerrogativa, passando a interferir nos objetivos, nas finalidades e nas
particularidades da profissão do Serviço Social, visto que seu objetivo
principal é construir as provas contra o agressor, finalidade esta que embora
relevante não seja objeto da intervenção do Serviço Social".
O Conselho Federal de
Psicologia, fls. 100/130, discorre longamente sobre as questões técnicas
envolvidas com o tema,
alegando que a inquirição da criança nos processos criminais que apuram a
existência de violência, com a finalidade de produção de prova, faz recair
sobre si uma responsabilidade para a qual não se encontra preparada em face de
sua condição de pessoa em desenvolvimento, em razão de sua imaturidade física,
cognitiva e psicossocial. In verbis: "o objetivo da inquirição da criança
é a produção de provas, hipótese que não encontra respaldo na aludida Convenção
Internacional [das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança] e tampouco no
ordenamento jurídico pátrio". Pugna pela legalidade e constitucionalidade
da Resolução combatida.
Por fim, o Conselho
Federal de Serviço Social, fls. 158/190, defende a legalidade e
constitucionalidade da Resolução, que estaria dentro de seu poder
discricionário, e, em relação ao mérito, em resumo, traz as mesmas alegações do
Conselho Regional da profissão.
O MPF pronunciou-se às
fls. 265/278, pugnando pela concessão da segurança.
Vieram os autos
conclusos.
Decido.
II – FUNDAMENTAÇÃO
A questão veiculada
neste mandamus foi devidamente analisada pela Juíza então oficiante no processo,
quando da apreciação da medida liminar, de modo que, para fundamentar o
presente julgado, utilizo-me dos argumentos então expostos pela referida
magistrada, o que faço nos termos a seguir:
"(...) A concessão
de liminar em mandado de segurança exige a conjunção de dois requisitos: o
fumus boni juris e o periculum in mora. No caso concreto, entendo presente os
dois requisitos.
Da leitura das
informações de todos os Conselhos envolvidos na querela, embora se observe uma
tentativa de resguardar o bem-estar de menores envolvidos em situação de
violência, atitude louvável não se pode deixar de consignar, vê-se que não há
amparo legal e constitucional para os atos emanados.
Em verdade, o cerne
deste processo não é, ao contrário do que consta das informações dos Conselhos,
a verificação da melhor forma de proteção aos menores. A questão aqui debatida
é se os Conselhos Federais de Psicologia e Assistência Social têm poderes para
emitirem Resoluções vedando os profissionais sujeitos a seus controles de
participarem do chamado depoimento sem dano.
Nesta linha de
raciocínio, verifico das informações das autoridades coatoras uma resistência
em admitir que menores de idade sejam submetidos a depoimentos judiciais, com o
fim exclusivo de instrução processual e punição dos autores dos atos de
violência, sob o argumento de que a exposição da criança a este ato pode
acentuar os danos causados.
Observa-se este
objetivo, por exemplo, que o Conselho Federal de Psicologia afirma que
"substituir a inquirição da criança vítima de violência sexual pela
perícia psiquiátrica, ou uma simples avaliação psicológica, com toda a sua
complexidade, e não a simples inquirição judicial, através de profissionais
especializados na área de infância, mostra-se o caminho mais recomendado para
assegurar à criança a proteção integral que a Constituição Federal preconiza,
em sintonia com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança e a
Lei n.º 8.069/90, reservando-se a medida apenas aos casos em que a criança
manifesta o desejo de ser ouvida pela autoridade judicial".
Ocorre que, com a
devida vênia, não cabe a qualquer Conselho de Profissão limitar a atuação
judicial, por mais nobres que sejam seus objetivos. Não pode e não deve
qualquer Conselho Profissional por caminhos transversos, porque discordam do
que está sendo feito, editar normas vedando profissionais de participar de atos
judiciais.
Ao contrário do que
defendem os Conselhos, com a vedação ocorrida, ao revés de se proteger a
criança a exporá a um risco de dano ainda maior. Isto porque, caso o Juiz da
causa entenda necessário o depoimento do menor, ele ocorrerá, seja através do
método que se pretende implantar, seja da forma tradicional, forma que, acho
que todos concordam neste ponto, é ainda mais lesivo aos interesses dos
menores.
Diante disso, resta uma
análise acerca da constitucionalidade das Resoluções. Inicialmente, até em
decorrência do princípio da legalidade e da liberdade profissional (art. 5º, II
e XIII da CF), qualquer restrição ao exercício profissional, ainda que advenha
dos Conselhos Profissionais, deve estar amparado em lei, fato não comprovado
por qualquer dos Conselhos que apontam que entendem não ser atribuição de
psicólogos e assistentes sociais tomar parte em depoimentos judiciais, mas não
indicam em qual lei estaria prevista tal vedação.
Nesta linha de
raciocínio, não cabe aos Conselhos proibirem seus profissionais de participarem
destes depoimentos, quando não há lei que preveja tal limitação. Apenas a
título exemplificativo, tomando por base um tema bastante polêmico e que
desperta paixões ainda maiores dos que no caso em análise, seria o mesmo que o
Conselho de Medicina, por qualquer motivo que fosse, religioso ou moral,
proibisse os médicos de fazerem abortos, ainda que nos casos autorizados em lei.
Não há espaço para tal.
Isto não significa que
as preocupações apontadas quanto à questão das limitações às prerrogativas
decorrentes do exercício das profissões não devam ser levadas em consideração.
Cada profissional envolvido no depoimento poderá, no caso concreto, avaliar se
suas prerrogativas estão ou não sendo violados. Entendo até que um profissional
possa discordar do que está sendo feito e se recuse a participar do programa,
por entender que viola seus direitos profissionais.
O que não tem amparo
legal nem constitucional é a vedação, ainda que por meios transversos, através
da ameaça de abertura de procedimentos disciplinares, da participação de todo e
qualquer profissional do Programa, quando não há amparo legal. Cada
profissional contado pelo Judiciário poderá analisar se deve ou não participar
do programa e até que ponto suas prerrogativas estão sendo violadas.
Mas, do mesmo modo que
não se pode obrigar um profissional a atuar no Programa, caso alegue que tenha
restrições de que ordem seja, até em relação à ética profissional, não podem os
Conselhos proibir seus profissionais de participar, apenas porque entendem que
existem outros meios menos danosos de se obter os dados necessários.
Neste sentido, pode o
Conselho, que tão firmemente crê no mal que pode causar o depoimento sem dano,
tentar conscientizar todos os envolvidos no Programa, como magistrados, membros
do Ministério Público, e mesmo os psicólogos e assistentes sociais, e juntos se
buscar a melhor forma de equacionar e contrabalançar toda a problemática
envolvida. Pode exercer seu direito de uma luta política neste sentido, de que
sejam editadas leis prevendo formas mais eficazes de se proteger o menor vítima
de violência.
Mas o que não pode é
através de Resoluções proibir profissionais de atuarem no programa, sem que tal
ato esteja embasado em lei. Isto a Constituição Federal os proíbe, pelo que
inconstitucionais as Resoluções n.º 554/2009 (Conselho Federal de Serviço
Social) e n.º 10/2010 (Conselho Federal de Psicologia).
Em relação ao perigo da
demora, observo que o impedimento do Programa pelo TJPE causa danos permanentes
às crianças e adolescentes vítimas de violência, no decorrer do processo
judicial.
Ante o exposto,
presentes os requisitos autorizadores, concedo a liminar, para suspender as
Resoluções n.º 554/2009 (Conselho Federal de Serviço Social) e n.º 10/2010
(Conselho Federal de Psicologia), determinando aos respectivos Conselhos que se
abstenham de qualquer ato, no sentido de impor sanções aos profissionais que
participam do Projeto ora em análise."
III - DISPOSITIVO
Isto posto, confirmo a
decisão liminar em todos os seus termos e concedo a segurança pleiteada para
determinar às autoridades impetradas que se abstenham de qualquer ato, no
sentido de impor sanções aos profissionais, com base nas Resoluções nº 554/2009
(Conselho Federal de Serviço Social) e nº 10/2010 (Conselho Federal de
Psicologia), que participam do projeto ora em análise.
Custas ex lege.
Sem condenação em
honorários advocatícios (Súmula n.º 512 do STF).
Sentença sujeita ao
duplo grau de jurisdição.
Publique-se.
Registre-se. Intimem-se.
Recife, 28 de outubro
de 2011.
JOAQUIM LUSTOSA FILHO
Juiz Federal em
exercício na 7ª Vara - PE
- Integra da Sentença:
_________________ / 2013 - Tipo A
Processo:
0004766-50.2012.4.05.8100
Classe 1 - AÇÃO CIVIL
PÚBLICA
Parte autora:
MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
Assistente
litisconsorcial da parte autora: ESTADO DO CEARÁ
Parte ré: CONSELHO
REGIONAL DE PSICOLOGIA DA 11ª REGIAO - CRP, CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA -
CFP, CONSELHO REGIONAL DE SERVICO SOCIAL 3ª REGIAO CE E CONSELHO FEDERALDE
SERVICO SOCIAL CFESS
SENTENÇA
1. RELATÓRIO
Trata-se de Ação Civil
Pública promovida pelo MINISTÉRIO PUBLICO FEDERAL em face dos réus: CONSELHO
REGIONAL DE PSICOLOGIA DA 11ª REGIAO - CRP, CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA -
CFP, CONSELHO REGIONAL DE SERVICO SOCIAL 3ª REGIAO CE - CRSS E CONSELHO FEDERAL
DE SERVICO SOCIAL - CFESS, visando, logo por tutela antecipada, à execução das
seguintes medidas: suspensão, em todo o país, dos efeitos da Resolução n.º
10/2010, expedida pelo Conselho Federal de Psicologia, bem como a Resolução N.º
554/2009, expedida pelo Conselho Federal de Serviço Social; a paralisação, no
todo e qualquer procedimento ou processo administrativo que tramite nos
Conselhos réus, destinado a apurar eventual descumprimento, por parte dos
psicólogos e assistentes sociais, das disposições constantes nestas Resoluções;
determinação do Conselho Federal de Psicologia e ao Conselho Federal do Serviço
Social para que, no prazo de 5(cinco) dias, proceda a ampla divulgação interna
da decisão que conceder a antecipação de tutela para suspender, respectivamente,
os efeitos da Resolução N.º 10/2010 e N.º 554/2009, encaminhando cópia, por
meio eletrônico, aos Conselhos Regionais, bem como para os profissionais neles
inscritos, além de disponibilizá-la na respectiva página da internet; e
cominação de multa diária no valor de R$ 5.000,00(cinco mil reais) para cada um
dos órgãos promovidos, no caso da medida antecipatória.
Por fim, arremata
requerendo a intimação da União Federal, do Estado do Ceará e do Município de
Fortaleza para integrarem a lide, na qualidade de assistentes litisconsorciais,
e que a demanda seja julgada procedente com a invalidação definitiva, pelo
vício de nulidade absoluta, das ditas Resolução N.º 10/2010 e N.º 554/2009.
Para tanto, alega que a
Secretaria de Direitos Humanos de Fortaleza - SDH representou ao MPF
solicitando providências em razão dos atos normativos editados pelo Conselho
Federal de Psicologia e pelo Conselho Federal de Serviço Social, que estariam
inviabilizando a implantação, na Comarca de Fortaleza/CE, do projeto "Depoimento
Especial".
Prossegue relatando que
a Secretaria de Direitos Humanos de Fortaleza - SDH esclareceu que o projeto
"Depoimento Especial" tem como referência o projeto "Depoimento
sem Dano - DSD", advindo do Judiciário de Porto Alegre/RS, com o escopo de
reduzir os danos durante a produção de provas judiciais em que as crianças e
adolescentes vítimas ou testemunhas de violência sexual são ouvidas, ao tempo
em que sua condição de pessoa em desenvolvimento é respeitada e sua palavra é
valorizada, evitando o constrangimento, vergonha e intimidação do menor.
Explica a metodologia utilizada no programa e defende a necessidade da
participação de psicólogo ou assistente social para o sucesso do projeto.
Além disso, evidencia
que a SDH asseverou que o Tribunal de Justiça do Ceará firmou com o Município
de Fortaleza, em 2009, o Convênio de Cooperação Técnica n.º 77/09, com o
objetivo de implantar a estrutura adequada para tal finalidade. Todavia, apesar
de destacado um profissional do serviço social para atuar na 12ª Vara Criminal
da Comarca de Fortaleza, que já conta com um psicólogo, o projeto encontra
dificuldades para a implementação em face da Resolução n.º 10/2010, expedida
pelo Conselho Federal de Psicologia, bem como a Resolução N.º 554/2009,
expedida pelo Conselho Federal de Serviço Social, que taxativamente proíbem os
profissionais da área de atuarem na sala de Depoimento Especial, sob pena de
sanção disciplinar.
Aduz ainda que a
Resolução n.º 10/2010, do CFP, e a Resolução n.º 554/2009, CFSS, violam os direitos
do psicólogo e do assistente social porque afrontam o livre exercício
profissional destas categorias, como também o dever destes profissionais de
contribuir para a prestação jurisdicional concernente às crianças e
adolescentes vítimas de abuso sexual. Destaca que os atos normativos em enfoque
retiram das crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual a proteção integral
catalogada no art. 3º do Estatuto da Criança e Adolescente - ECA.
Nesse cenário, conclui
esclarecendo que o objetivo do parquet Federal na lide é assegurar a liberdade
de exercício regular destes profissionais uma vez que as atividades destinam-se
a resguardar e proteger as crianças e adolescentes quando estão na condição de
vítimas ou testemunhas de violência sexual, sendo que as Resoluções em foco
malferem as normas constitucionais e legais concernentes à espécie.
Acastela ainda a
legitimidade passiva dos Conselhos Regionais para figurar na lide, pois têm o
dever de orientar, disciplinar e fiscalizar o exercício das profissões na área de
sua competência, em relação aos atos emanados das entidades federais, ao tempo
em que pugna pelo processamento do feito perante a Justiça Federal.
Ademais, discorre que a
decisão proferida no Mandado de Segurança n.º 5017910- 94.2010.404.7100/RS
impugnando a Resolução n.º 10/2010 merece referência, como também o "writ
consititcuional" de n.º 2009.71.00.031114-1/RS, no qual reconheceu que a
Resolução n.º 554/2009 exorbitou o Poder Regulamentar.
Procedimento
Administrativo n.° 1.15.000.000309/2012-63, das fls. 31/149.
Despacho (às fls. 190)
para a citação dos promovidos e para que se manifestem acerca do pedido de
tutela antecipada. Além disso, o ato determinou a intimação da União Federal,
do Estado do Ceará e do Município de Fortaleza para dizerem se têm interesse em
integrar a lide.
A União Federal
peticionou às fls. 206, informando que não tem interesse no feito.
O promovido Conselho
Regional de Serviço Social 3ª Região CE apresentou contestação às fls. 208/218,
apontando, preliminarmente, a ilegitimidade passiva e a incompetência do Juízo,
e, no mérito, asseverou que não merece guarida a pretensão do parquet federal.
Argumenta que o procedimento "Depoimento Sem Dano" não conta com
qualquer respaldo legal para a aplicação já que a legislação civil atribui
competência aos magistrados para a inquirição, não se revestindo nas
atribuições dos assistentes sociais. Por fim, embora reconheça a previsão das
Leis n.ºs 7356/80 e 9896/93 dos deveres dos assistentes sociais de prestar
assessoria técnica aos Juízes nas áreas da infância e juventude, nega o dever
de atuar no DSD. Documentos de fls. 219/245.
O promovido Conselho
Regional de Psicologia da 11ª Região colacionou manifestação (fls. 247/272) e
contestação (fls. 281/307), preambularmente, defendeu a função de
regulamentação da profissão de psicólogo como decorrência do Poder de Polícia,
com espeque no art. 5º, XIII, da Constituição Federal de 1988. Questiona se
exigir da criança a responsabilidade pela prova de violência sexual, através do
depoimento judicial, não seria uma nova violência contra a criança. Diferencia
a hipótese do art. 28, § 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, na qual a
oitiva da criança reverte-se em conhecimento dos seus sentimentos e de desejos
para a colocação da família substituta, ao passo que, no caso sob luzes, no seu
dizer, o objetivo da inquirição é a produção da prova, o que não encontra
amparo na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, ratificada
pelo Brasil, tampouco pelo ordenamento jurídico pátrio.
Prossegue asseverando
que a falta de compreensão da dinâmica do abuso sexual intrafamiliar,
verificado tanto nas agências de saúde como no Sistema de Justiça acaba por
gerar intervenções inadequadas com sensíveis prejuízos ao desenvolvimento da
criança. Destaca que "inquirir a vítima, com o intuito de produzir prova e
elevar os índices de condenação, não assegura a credibilidade pretendida, além
de expô-la a nova forma de violência, ao permitir reviver situação traumática,
reforçando o dano psíquico." E ainda: "É comum a criança avistar o
abusador no ambiente forense por ocasião de sua oitiva, ainda que o depoimento
não seja prestado na sua presença, fato que contribui para reacender o conflito
e a ambivalência de seus sentimentos, porquanto, em muitos casos, 'nutre forte
apego pelo abusador, com quem, no mais das vezes, mantém vínculos parentais
significativos".
Escorando-se nestas
razões, defende que quando a criança relata o fato ao Judiciário não se observa
qualquer medida para minimizar o sofrimento psíquico de corrente do trauma
vivido. Discorre que embora o princípio da verdade real autorize à inquirição
da vítima, paradoxalmente, a mesma inquirição não se reveste de credibilidade
absoluta. Acastela que substituir a inquirição da vítima de violência sexual pela
perícia psiquiátrica, ou uma avaliação psicológica, com toda a complexidade, e
não simples inquirição judicial, com profissionais especializados na área da
infância mostra-se o caminho mais adequado para assegurar à criança a proteção
integral que a Carta Magna preconiza.
Conclui que a Resolução
n.º 10/2010 do CFP não compromete a atuação da equipe multiprofissional e não
impede a assessoria do psicólogo ao magistrado, apenas impede de inquirir a
criança. Toca na inconstitucionalidade da Lei Estadual n.º 9.896/93, que
regulamenta o projeto DSD, por legislar sobre o exercício das profissões uma
vez que é competência privativa da União, nos termos do art. 22, XVI, da CF/88.
Por fim, asseverou que não merece respaldo a pretensão do parquet federal e que
a liminar requerida deve ser denegada.
O promovido Conselho
Federal de Psicologia apresentou manifestação e contestação (fls. 309/339), na
mesma linha de defesa do Conselho Regional de Psicologia da 11ª Região,
pugnando pela improcedência da tutela antecipada e do pleito trazido à baila.
Acervo probatório das fls. 340/369.
O MPF interpôs
requerimento às fls. 3671/372, para ser juntado nos autos da cópia da
Recomendação n.º 33, de 23/11/2010, do Conselho Nacional de Justiça, como
seguinte teor: "RECOMENDA AOS TRIBUNAIS A CRIAÇÃO DE SERVIÇOS
ESPECIALIZADOS PARA A ESCUTA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES VÍTIMAS OU TESTEMUNHAS
DE VIOLÊNCIA NOS PROCESSOS JUDICIAIS"., como também da reportagem
intitulada "País tem poucas salas especiais para ouvir crianças vítimas de
estupro", veiculada no Portal G1, em 22 de maio de 2012.
O Estado do Ceará
peticionou às fls. 390/391, informando que tem interesse no feito, uma vez que
o Tribunal de Justiça do Ceará, com a interveniência da 12ª Vara Criminal da
Comarca de Fortaleza, e a Secretaria de Direitos Humanos firmaram convênio
entre si para desenvolver conjuntamente a implantação do Projeto Depoimento Sem
Dano.
Certidão às fls. 396
informando que o CFSS foi intimado somente em 29/5/2012.
Despacho às fls. 397
para determinar ao Setor de Distribuição que retifique o concernente termo para
incluir o Estado do Ceará, na condição de assistente litisconsorcial do MPF, e
para declarar os efeitos da revelia em relação ao CONSELHO FEDERAL DE SERVICO
SOCIAL CFESS. Por fim, determinou que o MPF apresentasse réplica.
Termo de Retificação,
às fls. 398.
O MPF ofereceu réplica
à contestação, às fls. 403/419. Rebateu as preliminares ratificando que o CRSS
é parte legítima para figurar no pleito, dentre outros argumentos, porque cabe
a este Conselho aplicar as sanções disciplinares, e que a Justiça Federal do
Ceará é o órgão competente para apreciar causas em que tais mesmo que o CFESS
seja sediado em Brasília, pois poderá ser demando em qualquer unidade da
federação. Ressalta ainda que os Conselhos Federais que incidem sobre o direito
coletivo - psicólogos e assistentes sociais - e difusos - sociedade em geral -
têm natureza transindividual e indivisível, razão pela qual a decisão proferida
neste Juízo deverá ter efeitos abrangentes em território nacional. No mérito,
afastou as argumentações apresentadas pelos Conselhos réus resumidas em três
pontos: exercício regular do poder de polícia pelos Conselhos demandados,
prejuízo do projeto Depoimento Sem Dano às vítimas inquiridas e incompetência
dos profissionais mencionados para realização do Depoimento Especial,
rebatendo-os um a um. Reiterou os termos expostos na peça depórtico e requereu
a procedência da ação.
Decisão às fls.
421/422, indeferindo a tutela antecipada demandada na proemial, por necessidade
de maior amadurecimento da lide.
Cota do MPF n.º
18896/2012, às fls. 427, requerendo o julgamento da lide e informando que não
há mais provas a produzir.
É o breve relato, passo
a decidir.
2. FUNDAMENTOS
2.1. Preliminarmente
O promovido Conselho
Regional de Serviço Social 3ª Região CE apresentou contestação às fls. 208/218,
apontando, preliminarmente, a ilegitimidade passiva e a incompetência do Juízo.
2.1.1 Da competência da
Justiça Federal do Ceará
O promovido Conselho
Regional de Serviço Social 3ª Região CE aventou a incompetência do Juízo sob o
argumento que o foro competente para o processamento do feito trazido à baila é
o do Distrito Federal, uma vez que a sede do Conselho Federal da Assistência
Social localiza-se na Capital Federal.
Adiro ao posicionamento
do parquet federal.
Conquanto a autarquia
federal CFSS situe-se na Capital Federal, o âmbito de atuação abrange todo o
território nacional. Bem por isso, pode ser demandada em qualquer unidade da
federação, segundo as normas de direito processual civil - regras insertas no
art. 100, inciso IV, alíneas "a" e "b", do Código de
Processo Civil -, as autarquias federais podem ser demandadas no foro de sua
sede ou naquele em que se acha a agência ou sucursal em cujo âmbito de competência
ocorreram os fatos que geraram a lide.
Rejeito a preliminar
suscitada.
2.1.2 Da legitimidade
do CRSS para figura no feito
A tese defendida pelo
MPF merece prosperar.
Embora tecendo
considerações acerca das atribuições do CFSS e esclarecendo que não redigiu ou
publicou ou regulamentou qualquer resolução concernente ao programa Depoimento
Sem Dano - DSD, o CRSS é parte legítima para figurar no pleito.
É que cabe a este
Conselho aplicar as sanções disciplinares previstas pelo Código de ética
Profissional, como também àquelas regulamentadas pelo Conselho Federal dos
profissionais da Assistência Social, nos termos do art. 10 da Lei n.º 8.662/93.
Indefiro, por isso, a
preliminar.
2.1.3 Do interesse do
Estado do Ceará
O Estado do Ceará
peticionou às fls. 390/391, informando que tem interesse no feito, uma vez que
o Tribunal de Justiça do Ceará, com a interveniência da 12ª Vara Criminal da
Comarca de Fortaleza, e a Secretaria de Direitos Humanos firmaram convênio
entre si para desenvolver conjuntamente a implantação do Projeto Depoimento Sem
Dano.
Entendo que há o
interesse do Ente Estadual alencarino no feito, uma vez que se revela o
interesse jurídico na procedência do pleito.
Dessarte, reitere-se,
nos termos do despacho às fls. 397, o interesse do Estado do Ceará em integrar
a lide como assistente litisconsorcial da parte autora.
2.1.4 Da ausência de
contestação do Conselho Federal do Serviço Social - CFSS
Face à ausência de
contestação do Conselho Federal do Serviço Social - CFSS, o que faz presumir
verdadeiros os fatos narrados na petição inicial, decreto a revelia deste réu e
ressalvo que em caso de revelia, os fatos alegados pelo autor reputam-se
verdadeiros (art. 319, CPC). Os aspectos fáticos mostram-se também cristalinos.
2.2 Mérito
Passo ao julgamento
antecipado da lide, nos termos do artigo 330 do Código de Processo Civil.
O Ministério Público
Federal insurge-se face à Resolução n.º 10/2010, do CFP, e a Resolução n.º
554/2009, CFSS, na qual coíbe que os profissionais da psicologia e da
assistência social atuem como inquiridores no atendimento de crianças e
adolescentes em situação de violência sexual no projeto "Depoimento sem
Dano - DSD", advindo do Judiciário de Porto Alegre/RS.
De outro giro, os
Conselhos réus objetaram a pretensão, resumidas em três pontos: exercício regular
do poder de polícia pelos Conselhos demandados, prejuízo do projeto Depoimento
Sem Dano às vítimas inquiridas e incompetência dos profissionais mencionados
para realização do Depoimento Especial.
O desate da
controvérsia, portanto, está em perquirir se os Conselhos réus exorbitaram em
regulamentar o exercício das profissões por eles tuteladas em detrimento de
seus profissionais, como também do direito das crianças e adolescentes vítimas
de violência sexual.
Pois bem.
2.2.1 Do exercício
regular do Poder de Polícia pelos Conselhos demandados
É bem verdade que cabe
à União a fiscalização das profissões, contudo delega tal função às entidades
de fiscalização por meio de lei federal. O artigo 21 da Carta Magna dispõe
sobre a competência da União para "organizar, manter e executar a inspeção
do trabalho". A competência estabelecida no art. 21, XXIV, é delegada às
entidades de fiscalização do exercício profissional.
Trata-se da polícia das
profissões, delegada aos conselhos profissionais, na qual exercem atribuições
típicas do poder público. Possuem finalidade de disciplinar e fiscalizar, não
só sob o aspecto normativo, mas também punitivo, o exercício das profissões
regulamentadas, zelando pela ética no exercício destas, além de exercem poder
de polícia administrativa sobre os membros de determinada categoria
profissional, apurando situações contrárias às normas, aplicando, se
necessário, a penalidade cabível.
Cabe a estas entidades,
além de defender a sociedade, impedir que ocorra o exercício ilegal da profissão,
tanto por aquele que possua habilitação, mas não segue a conduta estabelecida,
tanto para o leigo que exerce alguma profissão cujo exercício dependa de
habilitação.
Entretanto, o poder de
polícia não é ilimitado, estando sujeitos a limites jurídicos, tais como,
direitos do cidadão, prerrogativas individuais e liberdades públicas
asseguradas na Constituição e nas leis. Maria Sylvia Zanella Di Pietro (DIREITO
ADMINISTRATIVO, 14ª EDIÇÃO, P. 116/117, ED. ATLAS, SÃO PAULO: 2002), fixa
algumas regras a serem observadas pela polícia administrativa, a fim de que não
se desrespeite os direitos individuais:
"1. a da
necessidade, em consonância com a qual a medida de polícia só deve ser adotada
para evitar ameaças reais ou prováveis de perturbações ao interesse público;
2. a da
proporcionalidade, já referida, que significa a exigência de uma relação
necessária entre a limitação ao direito individual e o prejuízo a ser evitado;
3. a da eficácia
(adequação), no sentido de que a medida deve ser adequada para impedir o dano
ao interesse público".(grifo nosso)
Dessa sorte, o
"poder da polícia das profissões" que é dado aos Conselhos
Profissionais está sujeito a controle quando desproporcional ou mesmo excessivo
em relação aos ao interesse tutelado pela lei.
É o que se verifica no
caso em tela, conforme adiante será explanado.
Em tempo, no que toca a
inconstitucionalidade da Lei Estadual n.º 9.896/93, o debate do ponto merece
abstração por se tratar de lei estadual do Estado do Rio Grande do Sul, sem
pertinência neste feito.
2.2.2 Prejuízo do
projeto Depoimento Sem Dano - DSD às vítimas inquiridas
Em defesa dos atos
regulamentares, os Conselhos réus questionam se exigir da criança a
responsabilidade pela prova de violência sexual, através do depoimento
judicial, não seria uma nova violência contra a criança. Objetam que a falta de
compreensão da dinâmica do abuso sexual intrafamiliar, verificado tanto nas
agências de saúde como no Sistema de Justiça acaba por gerar intervenções
inadequadas com sensíveis prejuízos ao desenvolvimento da criança.
Defendem que quando a
criança relata o fato ao Judiciário não se observa qualquer medida para
minimizar o sofrimento psíquico de corrente do trauma vivido. Indicam que a
inquirição da vítima de violência sexual pela perícia psiquiátrica, ou uma
avaliação psicológica, com toda a complexidade, e não simples inquirição
judicial, com profissionais especializados na área da infância mostra-se o
caminho mais adequado para assegurar à criança a proteção integral que a Carta
Magna preconiza.
Concluem que as
Resoluções não comprometem a atuação da equipe multiprofissional e não impede a
assessoria do psicólogo ao magistrado, apenas impede de inquirir a criança.
Em que pese os
argumentos acima delineados, a tese não merece sucesso.
Abstraindo-se a análise
sob o prisma do Estatuto da Criança e do Adolescente, as criminalizações dos
crimes de violência sexual estão catalogadas nos arts. 213 e seguintes do
Código Penal, nas quais incluem os crimes sexuais contra criança e adolescente.
Ressalve-se que o
sistema jurídico brasileiro reconhece a delicadeza do tema, não por outro
motivo condicionou a ação penal à representação nestes crimes, excetuando-se,
entretanto, os casos que envolvam os menores de dezoito anos ou pessoas
vulneráveis.
Isto é, não se discute
se deve ou não ocorrer a condenação de quem imprime violência sexual contra a
criança e adolescente, pois já existe esta previsão. O objetivo teleológico do
projeto "Depoimento sem Dano - DSD" é reduzir os danos durante a
produção de provas judiciais em que as crianças e adolescentes vítimas ou
testemunhas de violência sexual são ouvidas, evitando o constrangimento,
vergonha e intimidação do menor, por meio de psicólogos ou assistentes sociais.
Em verdade, penalizar
quem atenta contra a dignidade sexual de uma criança ou adolescente evita a
impunidade e incute na sociedade o temor de praticar tão bárbaros delitos de
forma deveras covarde. Não se discute aqui se a criança ou adolescente vítima
destes delitos, ao depor em Juízo, realmente terá restabelecida a saúde
psíquica. Por outro lado, não impede que trabalhos multiprofissionais sejam
executados para que o desenvolvimento destes seres em formação restabeleça o
seu caminho para que possam desfrutar da fase dos sonhos, dos heróis, das
princesas e príncipes que lhes são peculiares.
Nestes esteios, não
vislumbro qualquer prejuízo do projeto depoimento sem dano às vítimas
inquiridas, uma vez que as criminalizações dos crimes de violência sexual
contra criança e adolescentes estão positivadas.
2.2.3 Incompetência dos
profissionais mencionados para realização do Depoimento Especial
Por fim, não há
qualquer transferência ao técnico facilitador (psicólogo/assistente social) das
funções privativas da magistratura. Em verdade, o técnico facilitador atua
somente como intérprete na linguagem da criança e adolescente, pela especial
formação, revestindo-se somente no auxílio do juiz na inquirição de
testemunhas/vítimas de violência sexual.
Com as razões
alinhadas, afasto a objeção.
2.2.4 Dos efeitos da
Resolução n.º 10/2010, expedida pelo Conselho Federal de Psicologia, bem como a
Resolução N.º 554/2009, expedida pelo Conselho Federal de Serviço Social
De tudo quanto exposto,
restou demonstrado que o teor da Resolução n.º 10/2010, expedida pelo Conselho
Federal de Psicologia, bem como a Resolução N.º 554/2009, expedida pelo
Conselho Federal de Serviço Social, que proíbem o direito dos profissionais da
psicologia e da assistência social de atuarem no projeto Depoimento sem Dano -
DSD, é: a) desnecessária, pois impõe limite ao exercício profissional quando
não há ameaças reais ou prováveis de perturbações ao interesse público; b)
desproporcional, uma vez que há uma grande a limitação ao direito individual -
do exercício das profissões - sem um prejuízo comprovado a ser evitado; c)
inadequada, por acarretar dano ao interesse público, mormente, aos
profissionais da área, como também às crianças e adolescentes vítimas de abuso
sexual.
Não é outro o
entendimento do Quinto Regional sobre o tema, segundo o excerto, in verbis:
"PROCESSUAL CIVIL
E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA CONSELHOS REGIONAIS DE PSICOLOGIA E
SERVIÇO SOCIAL. RESTRIÇÕES IMPOSTAS POR RESOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O
sistema de escuta judicial "Depoimento Acolhedor de Crianças e
Adolescentes", conhecido também como "Depoimento Sem Dano", é um
modelo de sistema de escuta que possibilita a criança e o adolescente ser
inquirido em processos judiciais, visando instruir os autos, cabendo ao juiz
decidir sobre as perguntas a serem formuladas e ao profissional de psicologia
ou assistente social, como facilitador/intérprete, repassar as perguntas,
elaboradas pelo juiz, a criança ou adolescente. 2. A Resolução nº 10/2010, do
Conselho Federal de Psicologia-CFP, e a Resolução nº 554/2009 do Conselho
Regional de Serviço Social vedam a participação das categorias em tela no
Projeto de "Depoimento Sem Dano", sob o fundamento de que não é
competência e atribuição do psicólogo e do assistente social a inquirição
judicial de crianças e adolescentes. 3. Não obstante os Conselhos impetrados
tenham competência para expedir resoluções concernentes as atribuições e
competência dos profissionais em psicologia e assistente social,
respectivamente, verifica-se que a vedação e a penalidade impostas aos
referidos profissionais por participarem no sistema de "Depoimento Sem
Danos" extrapola as disposições legais previstas nas Leis nº 4.119/62 e
8.662/1993, que tratam sobre as atribuições das ditas profissões. 4. O livre
exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações
profissionais estabelecidas em lei, constitui direito individual fundamental
(CF/88, art. 5º, XIII), portanto, não pode o Poder Público, via de Resolução,
inovar a Ordem Jurídica e impor restrições ao profissional não estabelecidas em
lei. 5. É de ressaltar que os profissionais de psicologia e assistente social
quando do exercício no Projeto "Depoimento Sem Danos" não atuam como
inquiridor, mas facilitador/intérprete, utilizando-se do conhecimento técnico e
científico da profissão para reproduzir as perguntas elaboradas pelo juiz, da
melhor forma possível, visando o bem estar da criança e o colhimento de provas,
possibilitando, mais facilmente, a punição do possível agressor. 6. Mandado de
Segurança no qual se concede a segurança para determinar que os Conselhos
impetrados se abstenham de impor penalidades ou restrições aos/às profissionais
psicólogos e assistentes sociais envolvidos/as no Projeto Depoimento Sem Dano
(DSD) do Tribunal de Justiça de Pernambuco. 7. Precedentes do STJ e deste
Tribunal. 8. Apelações improvidas."(TRF 5ª Região, APELREEX 24564, 2ª T.,
DJE 30/10/2012, P. 255, Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto,
unânime, g.n.).
Cumpre destacar o teor
da Recomendação n.º 33, de 23/11/2010, do Conselho Nacional de Justiça:
"RECOMENDA AOS
TRIBUNAIS A CRIAÇÃO DE SERVIÇOS ESPECIALIZADOS PARA A ESCUTA DE CRIANÇAS E
ADOLESCENTES VÍTIMAS OU TESTEMUNHAS DE VIOLÊNCIA NOS PROCESSOS JUDICIAIS",
o que demonstra o posicionamento favorável do Judiciário Pátrio à implantação
do Projeto DSD.
Desta feita, não resta
outra opção ao Juízo, senão declarar que a previsão da Resolução n.º 10/2010,
expedida pelo Conselho Federal de Psicologia, bem como a Resolução N.º
554/2009, expedida pelo Conselho Federal de Serviço Social, quanto à vedação e
à penalidade impostas aos referidos profissionais por participarem no sistema
de "Depoimento Sem Danos" extrapola as disposições legais previstas
nas Leis nº 4.119/62 e 8.662/1993, e o "poder de polícia das profissões".
2.2.5 Do âmbito de
aplicação do decisum
Resta esclarecer o
âmbito de aplicação do decisum, afastando-se possíveis debates sobre o ponto.
Vislumbro que in casu pretende o parquet federal efetuar o controle dos efeitos
concretos de atos normativos federais.
A pretensão autoral,
portanto, busca abrangência nacional, o que deve ser deferida. É que se
verifica a configuração de questão prejudicial, incidental no processo, a qual
não gera efeitos erga omnes.
Nestes esteios, vejo a
possibilidade de acolhimento da abrangência da pretensão autoral afim de que se
evite o engessamento da atuação ministerial, porque incide sobre o direito
coletivo - psicólogos e assistentes sociais - e difusos - sociedade em geral -
com natureza transindividual e indivisível, sem que se configure a usurpação da
competência do Supremo Tribunal Federal, no controle concentrado de
constitucionalidade.
Endossando tal tese,
pronunciou-se o eminente Ministro Celso de Mello, verbis:
"AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. CONTROLE INCIDENTAL DE CONSTITUCIONALIDADE. QUESTÃO PREJUDICIAL.
POSSIBILIDADE. INOCORRÊNCIA DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL.- O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a legitimidade da
utilização da ação civil pública como instrumento idôneo de fiscalização
incidental de constitucionalidade, pela via difusa, de quaisquer leis ou atos
do Poder Público, mesmo quando contestados em face da Constituição da
República, desde que, nesse processo coletivo, a controvérsia constitucional,
longe de identificar-se como objeto único da demanda, qualifique-se como
simples questão prejudicial, indispensável à resolução do litígio principal.
Precedentes. Doutrina. (Informativo n. 211, de 1º de dezembro de 2000, g.n.).
No mesmo norte, o
precedente da Suprema Corte, irrespondível sobre o tema:
2.2.5 Do âmbito de
aplicação do decisum
Resta esclarecer o
âmbito de aplicação do decisum, afastando-se possíveis debates sobre o ponto.
Vislumbro que in casu
pretende o parquet federal efetuar o controle dos efeitos concretos de atos
normativos federais.
A pretensão autoral,
portanto, busca abrangência nacional, o que deve ser deferida. É que se
verifica a
configuração de questão
prejudicial, incidental no processo, a qual não gera efeitos erga omnes.
Nestes esteios, vejo a
possibilidade de acolhimento da abrangência da pretensão autoral afim de que
se evite o engessamento
da atuação ministerial, porque incide sobre o direito coletivo - psicólogos e
assistentes sociais - e
difusos - sociedade em geral - com natureza transindividual e indivisível, sem
que se configure a
usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal, no controle concentrado
de constitucionalidade.
Endossando tal tese,
pronunciou-se o eminente Ministro Celso de Mello, verbis:
"AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. CONTROLE INCIDENTAL DE CONSTITUCIONALIDADE. QUESTÃO PREJUDICIAL.
POSSIBILIDADE. INOCORRÊNCIA DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL.- O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a legitimidade da
utilização da ação civil pública como instrumento idôneo de fiscalização
incidental de constitucionalidade, pela via difusa, de quaisquer leis ou atos
do Poder Público, mesmo quando contestados em face da Constituição da
República, desde que, nesse processo coletivo, a controvérsia constitucional,
longe de identificar-se como objeto único da demanda, qualifique-se como
simples questão prejudicial, indispensável à resolução do litígio principal.
Precedentes. Doutrina. (Informativo n. 211, de 1º de dezembro de 2000, g.n.).
Portanto, não há
qualquer usurpação da competência do STF em sede de controle concentrado, uma
vez que há providência concreta requestada.
2.2.6 Do pedido de
antecipação de tutela
Com efeito, há nos
autos prova inequívoca do direito que pretende o MPF, pelos motivos delineados.
Assim, conforme tudo quanto exposto, estão presentes a verossimilhança e o
perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, este último consubstanciado
no comprometimento do exercício das profissões de psicólogo e assistente social
no projeto DSD, inclusive na 12ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza, por
conta do convênio desenvolvido conjuntamente para a implantação do Projeto
Depoimento Sem Dano, a ensejar a tutela antecipatória pretendida. Dessarte,
julgo presente a premência da tutela, com amparo no art. 12, caput, da Lei n.º
7.347/85, para determinar:
a) a suspensão, em todo
o país, dos efeitos da Resolução n.º 10/2010, expedida pelo Conselho Federal de
Psicologia, bem como a Resolução N.º 554/2009, expedida pelo Conselho Federal
de Serviço Social;
b) a paralisação, no
todo e qualquer procedimento ou processo administrativo que tramite nos
Conselhos réus, destinado a apurar eventual descumprimento, por parte dos
psicólogos e assistentes sociais, das disposições constantes nestas Resoluções;
c) que o Conselho
Federal de Psicologia e ao Conselho Federal do Serviço Social, no prazo de
5(cinco) dias, proceda a ampla divulgação interna da decisão para suspender,
respectivamente, os efeitos da Resolução N.º 10/2010 e N.º 554/2009, encaminhando
cópia, por meio eletrônico, aos Conselhos Regionais, bem como para os
profissionais neles inscritos, além de disponibilizá-la na respectiva página da
internet; e
d) a cominação de multa
diária no valor de R$ 5.000,00(cinco mil reais) para cada um dos órgãos
promovidos, no caso de descumprimento da medida antecipatória.
Concluo, portanto, pela
pertinência da demanda apresentada pelo MPF na presente ação civil pública, com
a concessão da tutela antecipada requerida.
3. DISPOSITIVO
Face ao exposto,
rejeito as preliminares suscitadas, ao tempo em que, JULGO PROCEDENTE o
pedido,para decretar a invalidação definitiva, pelo vício de nulidade absoluta,
da Resolução n.º 10/2010,expedida pelo Conselho Federal de Psicologia, bem como
a Resolução N.º 554/2009, expedida peloConselho Federal de Serviço Social.
Ademais, atendidos os
requisitos legais, CONCEDO A ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA, paradeterminar:
a) a suspensão, em todo
o país, dos efeitos da Resolução n.º 10/2010, expedida pelo Conselho Federalde
Psicologia, bem como a Resolução N.º 554/2009, expedida pelo Conselho Federal
de Serviço Social;
b) a paralisação, no
todo e qualquer procedimento ou processo administrativo que tramite nos
Conselhos réus, destinado a apurar eventual descumprimento, por parte dos
psicólogos e assistentes sociais, das disposições constantes nestas Resoluções;
c) que o Conselho
Federal de Psicologia e ao Conselho Federal do Serviço Social, no prazo de
5(cinco) dias, proceda a ampla divulgação interna da decisão para suspender,
respectivamente, os efeitos da Resolução N.º 10/2010 e N.º 554/2009,
encaminhando cópia, por meio eletrônico, aos Conselhos Regionais, bem como para
os profissionais neles inscritos, além de disponibilizá-la na respectiva página
da internet; e
d) a cominação de multa
diária no valor de R$ 5.000,00(cinco mil reais) para cada um dos órgãos
promovidos, no caso de descumprimento da medida antecipatória.
Isenção de pagamento de
despesas e honorários, na forma do art. 18 da Lei n.° 7.347/1985.
Publique-se.
Registre-se. Intimem-se.
Fortaleza/CE, 26 de
abril de 2013.
LUÍS PRAXEDES VIEIRA DA
SILVA,
Juiz Federal da 1ª Vara
Sentença.RLM
Nenhum comentário:
Postar um comentário